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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

"Factum principis" e sua aplicação prática: TST condena Incra no pagamento de verbas por fazenda desapropriada

Conforme ensina Augusto Cesar Leite de Carvalho, "O factum principis, ou fato do príncipe, é uma variação da força maior, designando uma ordem ou proibição de autoridade pública que frustra a execução do contrato, exigindo a imprevisibilidade e a irresistibilidade, no tocante ao empregador". Está previsto no art. 486 da CLT e pouco é visto na prática.

TST: Incra responderá por aviso-prévio e multa do FGTS de empregado de fazenda desapropriada

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou agravo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) contra decisão que o condenou a pagar aviso-prévio indenizado e multa de 40% do FGTS a um empregado de uma fazenda desapropriada no Município de Goianá (MG) para fins de reforma agrária. A autarquia alegava que a desapropriação do terreno se deu por interesse social, mas não conseguiu demonstrar divergências na interpretação da CLT que permitissem o exame do recurso de revista pelo TST.

O trabalhador rural foi demitido em 2013, após 36 anos de serviços prestados na Fazenda da Fortaleza de Sant'Ana, que o dispensaram com a justificativa do encerramento das atividades em decorrência da desapropriação. Como a fazenda faz parte do espólio do antigo proprietário, ele acionou os herdeiros e também o Incra para receber as verbas rescisórias.

Para o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), ficou caracterizado o chamado factum principis, ou "fato do príncipe", definido no artigo 486 da CLT como a paralisação temporária ou definitiva da prestação de serviços, em decorrência de ato praticado por autoridade pública federal, estadual ou municipal. Com esse entendimento, condenou o Incra ao pagamento apenas do aviso-prévio e da multa do FGTS, considerando que as demais verbas rescisórias (férias, 13º salário, etc.) seriam devidas pelos empregadores na vigência do vínculo de emprego.

No agravo pelo qual buscou trazer a discussão ao TST, a autarquia federal alegou que a desapropriação decorreu do reconhecimento de que o imóvel era improdutivo e não cumpria sua função social, nos termos do artigo 186 da Constituição da República. De acordo com o Incra, ao descumprir a função social da propriedade, os proprietários assumiram os riscos, descaracterizando o "fato do príncipe".

Contudo, a relatora do agravo, ministra Maria de Assis Calsing, ressaltou que a discussão não dizia respeito à regularidade do procedimento adotado, mas apenas ao enquadramento da situação jurídica no disposto no artigo 486 da CLT. "A questão se limita à constatação de que, no caso dos autos, ficou configurado o chamado ‘fato do príncipe', para fins de responsabilização da autoridade pública", afirmou.

A ministra explicou que a discussão sobre o não cumprimento da função social do imóvel e a responsabilidade do empregador é "fruto de construção jurisprudencial e interpretação do artigo 486 da CLT". Trata-se, portanto, de matéria de caráter interpretativo – tanto é que a Turma regional divergiu quanto ao alcance da norma, e a decisão foi por maioria. "Se uma norma pode ser diversamente interpretada, não se pode afirmar que a adoção de interpretação diversa daquela defendida pela parte justifica violação literal dessa regra, pois essa somente se configura quando se ordena expressamente o contrário do que o dispositivo estatui", assinalou.

Na avaliação de Calsing, competia ao Incra demonstrar interpretação diversa do dispositivo em questão entre TRTs ou a Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais do TST, o que não foi feito. A relatora concluiu que não foi demonstrada nenhuma violação legal e/ou constitucional ou divergência jurisprudencial, como exige o artigo 896 da CLT para o exame do recurso.

A decisão foi unânime.

Fonte: Notícias do TST.

Colaboração: Diogo Schreiber

Publicação (BLOG): Fabio João Rodrigues